Por Brasil e Portugal

pensamento tão tirado da costa de Adão, como das entranhas dos portugueses: Ostendit, quam difficile sit ab homine auferre, quod etiam in ejus cedit utilitatem: quam obrem opus est ab eo surripere, quod ipse concedere negligit. A costa de que se havia de formar Eva tirou-a Deus a Adão dormindo, e não acordado, para mostrar quão dificultosamente se tira aos homens, e com quanta suavidade se deve tirar ainda o que é para seu proveito. Da criação e fábrica de Eva dependia não menos que a conservação e propagação do gênero humano; mas repugnam tanto os homens a deixar arrancar de si aquilo que se lhes têm convertido em carne e sangue, ainda que seja para bem de sua casa, e de seus filhos, que por isso traçou Deus tirar a costa a Adão, não acordado, senão dormindo; adormeceu-lhe os sentidos, para lhe escusar o sentimento. Com tanta suavidade como isto, se há de tirar aos homens o que é necessário para sua conservação. Se é necessário para a conservação da pátria, tire-se a carne, tire-se o sangue, tirem-se os ossos, que assim é razão que seja; mas tire-se com tal modo, com tal indústria, com tal suavidade, que os homens não o sintam, nem quase o vejam. Deus tirou a costa a Adão, mas ele não o viu, nem o sentiu; e se o soube, foi por revelação. Assim aconteceu aos bem governados vassalos do imperador Theodorico, dos quais por grande glória sua dizia ele: Sentimus auctas illationes, vos addita tributa nescitis: Eu sei que há tributos porque vejo as minhas rendas acrescentadas; vós não sabeis se os há, porque não sentis as vossas diminuídas. Razão é que por todas as vias se acuda à conservação; mas como somos compostos de carne e sangue, obre de tal maneira o racional, que tenha sempre respeito ao sensitivo. Tão ásperos podem ser os remédios, que seja menos feia a morte, que a saúde. Que me importa a mim sarar do remédio, se hei de morrer do tormento?