A organização nacional; Primeira parte – a Constituição

Se, de um momento para outro, uma espécie de cataclismo social pacífico os despojasse da fortuna, dando o bem-estar a todos, sem os despojar dos benefícios da saúde e do conforto, da cultura moral e intelectual, garantida a sorte dos filhos, seriam, sinceramente, mais felizes do que são hoje, na posse privilegiada da riqueza.

Os miseráveis, por sua vez, não odeiam e não se revoltam senão porque a dor da fome e da moléstia, irritada pelo contraste com o luxo, fere tanto como o látego do feitor. É preciso fazer abstração, quando se estuda o problema social e econômico de nossos tempos, dos crimes e atentados da propaganda pelo fato, dos anarquistas revolucionários e demagogos do proletariado — criminosos encaminhados para os desvarios das lutas políticas e sociais, como outros são encaminhados para diversas formas da paixão e da violência. Contrabalançam-nos, no quadro dos flagelos sociais, os heróis dos despotismos políticos e das espoliações financeiras, que espalham mais cadáveres e desgraças sobre a terra do que as bombas dos anarquistas.

Entre os prejuízos do espírito humano, nenhum é mais querido, e nenhum tão falso, como o da aspiração da felicidade. O homem imagina-se sempre em caminho para o seio de uma beatitude terrestre, em que, em falta do céu da eterna santidade, para uns, ou do paraíso de eternas volúpias, para outros, a fortuna lhe dará, numa infinidade de prazeres e de gozos, contínua e imperturbável alegria.

É que, em verdade, a nossa vida foi transviada pela moral das religiões, entre o inferno e o